A Entropia
Shibas e Peixes Ornamentais me permite exemplificar a Entropia, um conceito da termodinâmica, que reza, em termos simples, que para manter um sistema organizado é preciso aplicar energia, ou, contrariamente, um sistema deixado ao acaso termina por deteriorar.
Anos atrás, comprei casais de guppies de raça pura, da variedade HB Red: half black red, do maior criador desses peixes, que mora em Santos-SP.
Separei uns cinco casais em aquários dedicados e coloquei os casais restantes em minha piscina. Tudo correu bem com os casais de reprodução, que geraram exemplares corretos, lindos.
Na minha piscina, entretanto, passados seis meses, havia cardumes de uma miscelânia caótica de cores, de todos os matizes, inclusive cobras, albinos, etc.
Essa foi uma chocante lição de que para manter uma linhagem é preciso dedicar organização e esforço, para melhorar é preciso mais do que isso.
Guppies maturam aos três meses e reproduzem mensalmente, independente de nova fertilização, e, portanto, são mais fáceis para distinguir a reprodução aleatória da seletiva. Os cães, embora sigam as mesmas regras genéticas, têm um ciclo muito mais longo.
O que manter ou melhorar em Shibas
Todo o complexo biológico, desde o fenótipo, ou seja, a conformação física do exemplar, até a sua essência, ou seja, o temperamento, são elementos que precisam ser identificados e mensurados, em relação ao Padrão da Raça, para que possam ser pretendidos ou verificados.
Cada raça tem esse modelo único ideal, com características específicas. Essas características são descritas em um documento oficial: “Padrão da Raça”. Pode ser o tamanho, a cor, o tipo de pelagem, o comportamento. Os criadores usam essa “receita” como guia para fazer cães que tenham as características certas. Afinal, criamos cães de raça pura para termos previsibilidade, saber como serão.
Normalmente, os padrões valorizam alguns atributos em relação a outros. No Shiba, o principal é o temperamento, logo a conformação dos olhos, das orelhas e da cauda. Concomitantemente, há condições de aceitação, que independem das mencionadas, como por exemplo, um macho Shiba com menos de 38 cm é desqualificado, porque não atinge a altura mínima.
Portanto, melhoria não é para amadores de fundo de quintal, que cruzam ao acaso, com o que estiver disponível.
Shibas e Peixes Ornamentais – Melhoria Genética
Em cães ou peixes, a geração de progênie é estatística, probabilística, não determinada. Em uma ninhada, alguns filhotes serão (para cada um dos fatores medidos) melhores, iguais ou piores do que seus genitores. Há então uma distribuição estatística normal, a famosa curva de gauss ou de sino, em que as medidas se situam. É preciso escolher os que forem melhores que os pais, primeiro, e mais conformes ao Padrão da Raça.
Como costuma dizer a excepcional criadora Elettra Grassi, “passo a passo a criação é uma aventura fantástica entre a arte e a ciência“.
Ora a melhoria genética é formulada por aproximações constantes e sucessivas ao padrão da raça. Temos um casal de excelente qualidade: produzimos uma ninhada com, digamos, quatro exemplares. Acompanhamos cada um deles, mesmo que sejam vendidos, e verificamos sua qualidade. Se nenhum deles superou os pais, esquecemos. Mas, se um deles ou mais de um saíram mais perfeitos que os pais, vamos promover um novo casamento, buscando um pequeno avanço. E, assim, sucessivamente.
Cuidando os riscos
Aqui é onde é preciso dominar a genética. Cada cachorro tem “ingredientes genéticos” não aparentes, ou seja que não se manifestaram. Se os pais, por parentesco, têm genes muito parecidos (algo chamado homozigose), a soma de dois genes iguais pode fazer com que apareçam falhas que estavam escondidas por outros genes, antes dominantes, criando um risco maior de passar doenças ou problemas genéticos para os filhotes.
Como nunca iremos utilizar um cão que tenha defeitos aparentes sérios, os defeitos indesejados de cruzamentos fechados serão aqueles que até então eram recessivos.
Então, sabemos que cruzamentos muito próximos, pais e filhas, primos, podem acelerar a conquista de determinadas virtudes pretendidas, porque a existência de dois genes de igual efeito potencializa esse efeito. Mas, como já dissemos, pode, também, fazer surgir defeitos e moléstias que estavam mantidas em recesso.
Como calcular o coeficiente de consanguinidade?
Para responder essa questão, você precisa calcular o coeficiente de consanguinidade COI utilizando a fórmula COI = (½)N. Lembre que N é o número de passos que unem dois consangüíneos a um ancestral comum e que ½ é a probabilidade de ocorrência de cada passo genético.
A Dra. Fabiana alerta na apostila a seguir citada (e linkada) que ” Desta forma, é de extrema importância, ao planejar este tipo de acasalamento, realizar o cálculo do COI antes de efetivar a reprodução, afinal um COI superior a 11% será um valor que demonstra grande risco, e o/criador tem condições de trocar o futuro pai ou mãe da ninhada, para produzir uma ninhada com mais segurança.
Quem quiser esclarecer melhor este ponto, pode ver a apostila publicada pela CBKC e visitar, diretamente o site da autora, Fabiana Michelsen de Andrade, Biol., MSc, PhD,especialista e consultora no assunto. Eu já a “conhecia” através do YouTube.
Fiquei feliz em ver que ela desenvolveu trabalhos em conjunto com nossa Veterinária a Doutora Mariana da Fertivida. Eu já a “conhecia” através do YouTube.
Dilema fundamental
Esse é o dilema básico da reprodução seletiva. Avançamos mais rapidamente quando temos maiores graus de parentesco. Muitos cães excepcionais em si mesmos são obtidos por cruzamentos muito fechados. Esses cães, em que a composição genética materializada foi “ótima” podem ser imprestáveis para reprodução, pois que sua estampa perfeita esconde uma preponderância de genes indesejados latentes.
Foi somente investindo ums fortuna para enviar uma importante Rottweiler, Blast von Schwarz Wappen, cruzar com o Campeão Mundial em Tampa, na Florida, com todas as despesas de taxa de cruzamento, passagens, hospedagem, minavan, alimentação, honorários dos acompanhantes, etc. que descobri que ele, de maravilhoso fenótipo, ‘imprimia” muito mal.
Isso por que, aproveitando o meu investimento, dois outros criadores enviaram matrizes para cruzar com ele e recebi em pagamento as primeiras escolhas de fêmeas, que acabei dando de presente, tão fora de padrão que eram.
A Objetividade Alemã
Na Alemanha, a reprodução das raças Pastor Alemão e Rottweiler são administradas com um profissionalismo surpreendente pelos clubes especializados. O ADRK (Allgemeiner Deutscher Rottweiler-Klub e.V.) possui uma estrutura com árbitros responsáveis pelo acompanhamento da reprodução, que autorizam os cruzamentos e dispõem nos pedigrees as características observadas nos exemplares e registram os resultados dos cruzamentos.
Assim, acompanham o fenótipo dos genitores, mas também o dos descendentes, estabelecendo relações de causa e efeito e tendo o poder de vetar cruzamentos provavelmente mal arquitetados.
Os mesmos critérios são adotados pelo Clube Alemão de Pastores Alemães, que submetem os cães a um Teste de Predisposição de Cruzamento, não só quanto ao padrão da raça, mas também quanto ao temperamento adequado. Aqui também pessoas qualificadas visitam as ninhadas nascidas para registro da qualidade.
Os pedigrees desses clubes especializados são mais informativos que os normais, da FCI. Mas isso é um fenômeno cultural, inerente aos alemães, sempre disciplinados, organizados e amantes de animais.
A Cultura Nipônica
A Nippo, da qual somos sócios, não mantém uma estrutura formal para acompanhamento da reprodução. Ela executa um extraordinário trabalho de preservação da raça, em todos os aspectos, mas por vias diferentes.
A cultura nipônica dispensa as formalidades, eis que os criadores espontaneamente adotam tutores para os orientar nos cruzamentos e trocam informações sem necessidade de um regime burocrático.
Os títulos promocionais
Os pedigrees da CBKC consignam os títulos promocionais dos exemplares que dele constam. Assim, os interessados podem confirmar que esses exemplares, quando titulados, foram submetidos a escrutínio de suas qualidades morfológicas e de temperamento, por árbitros altamente competentes
Essa já é uma informação relevante, embora não seja terminativa. Não basta que ambos os genitores sejam bons e de boas linhagens, é preciso compatibilizar o casal para obter uma determinada melhoria.
Veja na tabela acima todas as possibilidades que um Shiba tem de possuir títulos promocionais.
Os códigos (A1…GA) antecedem o nome dos cães listados no anverso do pedigree, evidenciando que são campeões, grande campeões ou o que mais sejam.
A raça Shiba possui um pedigree internacional on line, de que participam muitos criadores no mundo, ele contém diversos dados sobre os exemplares, inclusive fotos. Vale a pena visitar. E, por favor, procure pelos exemplares do nosso plantel.
O Pedigree
O pedigree é peça fundamental para os estudos de reprodução. Afinal, estamos tratando com cães de raça pura, e esse é um atestado dessa pureza. Em primeiro lugar vamos estudar os antecedentes dos exemplares que serão cruzados. Como dissemos, o fato de deterem títulos promocionais já é uma vantagem pois foram julgados excelentes, pelo menos.
Há muitas crendices a respeito. Alguns acreditam que o pedigree, ou seja, a disposição da árvore genealógica por diversas gerações, é mais importante que o animal em si, outros, que “a metade de pedigree entra pela boca”. A maioria dessas afirmativas é absolutamente imprecisa.
A última afirmativa considera que a nutrição é muito importante, o que é verdade. Mas, somente quem tentou competir com um exemplar bem-dotado e bem alimentado, pode reconhecer que a nutrição não altera o fenótipo potencial do exemplar.
Assim, a má nutrição pode impedir o animal de atingir a altura devida ou o temperamento adequado, mas a mais perfeita alimentação não poderá tornar um descendente de imperfeitos em uma maravilha.
Um animal mal nutrido e por isso defeituoso ainda poderá reproduzir bons exemplares, que adequadamente alimentados atingirão excelentes condições. A recíproca não é verdadeira.
Importância da Linha de Sangue
Como sabemos, algumas características possuem uma capacidade de transmissão maior do que outras, ou seja, uma maior herdabilidade. Assim, características diferentes terão diferentes importâncias em cruzamentos.
A primeira e mais óbvia conclusão sobre a tabela é que à medida que a característica tem herdabilidade mais elevada, maior a importância da informação contida no pedigree.
Da mesma forma, quanto mais próximo do padreador e da matriz, mais importante será a sua contribuição para os futuros descendentes, o que é ampliado pela grandeza da herdabilidade.
Além dos avós, pouca será a adição de probabilidade de materialização da característica na ninhada.
O autor enuncia um erro padrão de 15 a 20%, tal que um percentual de 50% varia de 42,5 a 57,5 ou de 40 a 60, utilizando 15 e 20%, respectivamente.
Baixa herdabilidade é considerada 29% ou menos, média entre 30 e 50%, e alta acima disso.
O Shiba, posso afirmar, no quesito Instinto de Caça, que é dependente da raça, que ele será provavelmente situado no percentual mais elevado possível.
Elementos não evidentes
Há limitações decorrentes da complexa dinâmica da genética, em que há muitos mecanismos desconhecidos, ainda.
O pedigree mostra o fenótipo do exemplar, ou seja, ele vai dizer que um determinado exemplar é vermelho, na pelagem, por exemplo. Mas, somente a verificação da cor do antecedente dele poderá eventualmente esclarecer se essa cor é resultante de dominância ou de homozigose. A descoberta do genótipo poderá ser relativamente simples, ou não, dependendo da característica. mas não evidencia o genótipo.
O caso das cores do Shiba é tratado em outro post aqui do site, o que torna essa característica menos complexa, mas em geral, há seis possibilidades, quando a característica é decorrente de dois genes apenas, um de cada genitor.
Elenco das possibilidades
Cada genitor possui uma dose dupla de um gene dominante. Toda a progênie será puramente dominante para essa característica. Ela não carregará nenhum gene recessivo.
Apenas um genitor é puro para o gene dominante, o outro parece ser puro, mas carrega o gene recessivo. Metade da progênie será pura para a característica, a outra metade parecerá pura para a característica, mas carregará o gene recessivo.
Apenas um genitor parece ser puramente dominante, mas carrega a característica recessiva, ou seja, é puramente recessivo. Tem que ser, ou então pareceria com os de gene dominante, que mascaram o gene recessivo. Metade da progênie parecerá com o genitor que é aparentemente dominante, mas que carrega um gene recessivo, Metade será como o de gene puramente recessivo. Ou seja, todos os filhos carregam um ou dois genes recessivos para a característica.
Ambos os genitores parecem ser puramente dominantes, mas cada um carrega um gene para a característica recessiva. Os filhotes desse casamento serão 25% puramente dominantes, com ambos os genes dominantes, 50% aparentemente dominantes, como os pais, mas carregando um genen recessivo, 25% parecerão com os avós dos quais os pais herdaram os genes recessivos.
Um genitor é puramente dominante, com dois genes dominantes. O outro é puramente recessivo, com dois genes recessivos. Todos os filhotes vão parecer com o genitor com a característica dominante, mas cada filhote vai carregar um gene recessivo.
Ambos os pais são puramente recessivos. Todos os filhote são como eles. Pais e filhotes vão ser como eles, tendo uma dose dupla do gene recessivo.