DOR EM CÃES
Ninguém quer ver seus cães com dor ou desconforto. Lamentavelmente, o sofrimento deles nem sempre é evidente. Cães, instintivamente, costumam ficar quietos e esconder sua dor, pois não conseguem verbalizar o que sentem.
Além disso, cães de algumas raças são muito resistentes à dor. Um Rottweiler meu, foi atropelado em frente à minha casa e destruiu a frente do automóvel: para-choque, farol, capô, mas sofreu uma fratura helicoidal na perna da frente, sem emitir um som. Mantido em local restrito, em uma semana estava como novo.
RAÇAS DIFERENTES, DORES DIFERENTES
Embora caibam mais estudos, há um consenso em que raças diferentes apresentam sensibilidades a e limiares de dor também diferentes.
Estudo envolvendo 10 raças de cães, pela North Caroline State University confirma que caninos têm tolerância e sensibilidade variadas à dor. Curiosamente, porém, as descobertas nem sempre correspondem à forma como os veterinários veem a sensibilidade à dor entre as raças.
O estudo envolveu 149 cães adultos, machos e fêmeas, no total, agrupados pela forma como os veterinários e o público em geral os classificaram em termos de sensibilidade à dor: alta (chihuahua, pastor alemão, maltês, husky siberiano); média (border collie, boston terrier, jack russell terrier); ou baixa (golden retriever, pitbull, labrador). Aqueles com alta sensibilidade à dor são considerados como tendo menor tolerância.
Figura extraída do 2022 AAHA Pain Management Guidelines for Dogs and Cats
Mais uma vez, os Shibas são beneficiados nessa classificação, pois não são chorões e suportam bem a dor. Isso não quer dizer que não sejam meio histéricos para desconfortos, tais como os tentar imobilizar e coisas semelhantes, quando emitem o famoso “shiba shout”.
Precisamos zelar pela condição dos nossos cães. Para tanto, temos que aprender a entender o seu comportamento e reconhecer quando estão sofrendo, seja por ferimentos ou problema de saúde.
INTENSIDADE DA DOR
Diferentes intensidades, diferentes comportamentos:
Dor leve: estudos mostram que cães com dor leve geralmente ficam menos alertas e excepcionalmente quietos, com relutância em se mover normalmente e parecem ter corpos rígidos.
Dor intensa: Observou-se que cães com dores intensas são o oposto daqueles com dores leves e expressam muitos sinais. Tremores, falta de apetite e aumento da respiração são os sinais mais comumente observados.
COMO SABER QUE MEU CÃO ESTÁ COM DOR
Embora sejam bons em esconder, há muitos sinais de que o cão está enfrentando desconforto ou dor.
AGRESSÃO
Um dos mais observados em cães com dor é a agressão.
Se, de repente, ele começar a rosnar, abaixar as orelhas ou até mesmo morder você, é porque tem medo que você faça algo para machucá-lo. Animais feridos, machucados ou com dor, instintivamente entrarão em modo de proteção.
Tentarão ficar longe de todos porque estão preocupados que os machuquem ainda mais.
CHORAMINGO E GANIDO
Eles podem expressar seu desconforto por meio de ganidos, choramingos, latidos, rosnados ou, às vezes, uivos. Ouvir seu cão choramingar ou ganir é de partir o coração.
Os cães, especialmente os cães jovens que ainda não sentiram dor física, podem recorrer a ganidos e choro quando sentem dor.
BUSCA DE AFETO
Nem todos os cães que sentem dor evitam interações. Alguns, quando estão com dor, podem ser mais afetuosos. E estarão em cima de você e buscando atenção e carinho constantemente.
MUDANÇA DE COMPORTAMENTO
Cães com dor podem alterar hábitos. Podem parar de correr e cumprimentá-lo na porta quando você chegar em casa, por exemplo. Poderão evitar o contato com você, ou impedir que os acaricie.
Se notar que seu filhote está se escondendo de você e evitando interações, pode ser que ele esteja com dor.
MUDANÇA DE HABITOS DE DORMIR
Seu cachorro está dormindo mais do que o normal?
Dormir pode ser a maneira de o corpo tentar se curar. Mas também pode ser por que têm problemas para se movimentar e serem ativos.
Cães com dor também podem apresentar inquietação, ter dificuldade em se sentir confortáveis. Se você os vir tendo dificuldade em sentar ou deitar, são sinais de que estão em perigo.
MUDANÇA DE HABITOS DE ALIMENTAÇÃO
Você deve observar é se eles mudam seus hábitos de beber e comer. A perda de apetite é um sintoma comum quando se trata de dor em cães.
SINAIS FÍSICOS
Alteração na forma como eles carregam o corpo, como andam devem ser consideradas.
Ele está segurando a cabeça abaixo dos ombros ou está um pouco curvado ou rígido?
Se notou que o movimento geral do cão mudou, é melhor entrar em contato com seu veterinário para obter mais explicações.
OFEGAR
Ofegar ou ter dificuldade para respirar, respirar mais rápido ou mais fracamente. Ofegar pode significar muitas coisas, incluindo dor, insolação ou envenenamento. Também pode ser um sintoma de pancreatite.
TREMORES
Tremores ou calafrios podem ser causados por vários motivos. Alguns cães tremem por causa de mudanças repentinas de temperatura. Outros, salvo os bons Shibas, tremem por causa de trovões ou fogos de artifício. Alguns por causa de alguma doença subjacente.
Tremores são um sintoma comum para cães com doenças renais, artrite, cinomose ou trauma físico. Mas essas doenças geralmente são acompanhadas por outros sinais como diarreia, vômito e claudicação.
EXCESSO DE LAMBIDAS
Aqui é mais difícil notar no Shiba, que costuma se limpar como os gatos, lambendo-se.
Mas, quando um cão é ferido, seu primeiro instinto é limpar e lamber a área da ferida. Mas não precisa necessariamente ser uma ferida. Algumas dores podem ser internas e o cão ainda lamberá a área pensando que vai curá-la. Por exemplo, se um cachorro lambe demasiado as pernas, isso pode ser um sinal de artrite. O que um veterinário poderá confirmar.
OLHOS
Cães que estão sentindo dor nos olhos tendem a lacrimejar, apertar os olhos ou piscar com mais frequência do que o normal. Há muitos problemas oculares diferentes em cães e todos eles têm diferentes níveis de dor e desconforto.
UM TIPO ESPECIAL DE DOR
A dor neuropática em cães é uma condição complexa que resulta de lesões ou disfunções no sistema nervoso periférico ou central. Ela é caracterizada por sensações anormais, como formigamento, queimação ou pontadas agudas, que podem ser crônicas e debilitantes. Experimentei dois eventos dessa espécie:
O primeiro, com a minha Kiko, em um pós-parto, em que passou a me acompanhar permanentemente, colada em minha perna, por onde eu fosse. Estava em total insegurança. O neurologista descobriu que ela tinha dor na coluna cervical e ministrou um calmante e um analgésico. Ela retornou à normalidade.
O segundo, com um filhote nosso que começou a intempestivamente correr e tentar morder o rabo. Só me comunicaram após ter consultado dois veterinários sem sucesso. Estive com eles, em um município próximo, e nessa visita ele estava normal. Pedi então que filmassem a ocorrência o que foi feito. Afinal, um neurologista reconheceu o problema e o caso, também, foi solucionado.
No Help Desk aqui do site, recebi uma consulta de São Paulo, interior, em que o quadro era semelhante, e recomendei que procurassem um neurologista veterinário.
A dor neuropática é provavelmente uma condição pouco reconhecida em pacientes veterinários com uma variedade de doenças neuromusculoesqueléticas. A literatura específica relacionada ao diagnóstico e tratamento de dor neuropática em cães é limitada, embora informações relacionadas a mecanismos e opções de tratamento possam ser extrapoladas da literatura humana.
Medicamentos especificamente direcionados à redução da dor neuropática, exigirão estudos prospectivos controlados avaliando sua eficácia para reduzir sinais clínicos compatíveis com dor neuropática, tal como a alodinia (refere-se a uma condição em que um animal sente dor devido a estímulos que normalmente não causariam dor, como um toque leve ou uma mudança de temperatura) e a hiperestesia (condição em que os estímulos sensoriais são ampliados): condições em que o paciente sente dor em resposta a estímulos que normalmente não seriam dolorosos.
Os clínicos veterinários devem estar cientes da dor neuropática como uma entidade potencial em pacientes e devem considerá-la ao desenvolver uma abordagem multimodal para o tratamento da dor.
CAUSAS DE DOR EM CÃES
Existem dois tipos de dor: aguda e crônica. Algo que acabou de acontecer, como uma lesão ou doença, causa dor aguda. Coisas que já acontecem há mais tempo, como artrite ou doença dentária, causam dor crônica.
Qualquer coisa que danifique as células ou crie inflamação pode causar dor em cães, incluindo:
Danos aos ossos ou articulações
Lesões de tecidos moles, como entorses, distensões ou hematomas
Problemas nas costas
Doenças dentárias
Infecções de ouvido
Infecções na pele
Infecções do trato urinário
Dor de estômago grave
Alguns tipos de câncer
Cirurgias
COMO AJUDAR CÃO COM DOR
OPÇÕES DE TRATAMENTO PARA CÃES COM DOR
Existem muitas opções de tratamento para eliminar ou aliviar a dor em cães. É importante primeiro consultar seu veterinário para que a opção de tratamento adequada seja dada.
ACOMPANHAMENTO DOS SINTOMAS EXIBIDOS
Manter um registro dos sintomas que você vê em seu cão pode ajudar muito. Às vezes, ele mostrará um sintoma específico, mas quando for ao veterinário, não o exibirá.
Assim, tire fotos ou vídeos do seu animal quando ele estiver exibindo sinais de dor. Por exemplo, grave-o quando ele estiver mancando ou tendo uma postura incomum. Mostrar isso ao veterinário pode ajudá-lo a entender melhor o possível problema.
GRADUAÇÃO DA DOR
Há vários protocolos de metrologia, destinados a classificar as dores dentro de escalas de intensidade. Nenhum é perfeito ou preciso, mas observam critérios que permitem comparações. Todos foram criados por centros de pesquisa. A maioria deles aborda as dores crônicas, ortoartrite e similares. Servem para acompanhar a evolução positiva ou negativa do tratamento. A maioria envolve não apenas Veterinários e técnicos, mas também os proprietários dos animais.
Os métodos de avaliação variam de empíricos e não validados (por exemplo, “Como seu cachorro sobe escadas?”) até validados (por exemplo, picos de forças verticais medidos por plataformas de força). Os métodos variam amplamente em termos de mão de obra necessária, complexidade e custo.
A avaliação da dor é praticamente dividida em avaliação de dor aguda ou perioperatória e dor crônica. Na clínica, a avaliação da dor inclui apetite, observação do comportamento e palpação. Os cães ajustam seu comportamento, postura e movimento para minimizar a dor. A inapetência e o comportamento calmo podem representar sinais sutis de dor. As observações são convertidas em uma pontuação, como a Escala de Dor Aguda Canina da Universidade Estadual do Colorado ou a escala de medida composta de dor de Glasgow, que pode ser rastreada ao longo do tempo.
Nenhuma ferramenta de avaliação da dor aguda preenchida pelo proprietário foi desenvolvida. Portanto, a avaliação da dor aguda “em casa” pelos proprietários deve ser orientada pela equipe veterinária.
O questionário mais utilizado é o Canine Brief Pain Inventory, com onze questões.
FORMULARIO “BREVE INVENTÁRIO DE DOR CANINA”
BREVE INVENTÁRIO DE DOR CANINA
DESCRIÇÃO DA DOR
1. Marque o número que melhor descreve a dor em seu pior nos últimos sete dias.
Um representa, sem dor, 10 representa extrema dor.
2. Marque o número que melhor descreve a dor em seu mínimo nos últimos sete dias.
Um representa, sem dor, 10 representa extrema dor.
3. Marque o número que melhor descreve a dor em sua média nos últimos sete dias.
Um representa, sem dor, 10 representa extrema dor.
4. Marque o número que melhor descreve a dor agora.
Um representa, sem dor, 10 representa extrema dor.
DESCRIÇÃO DA FUNÇÃO
Marque o número que melhor descreve como nos últimos sete dias a dor interferiu com seu cão:
5. Atividade geral
Um representa, não interferiu, 10 representa interferiu completamente.
6. Gostar da vida
Um representa, não interferiu, 10 representa interferiu completamente.
7. Habilidade de levantar a partir de estar deitado
Um representa, não interferiu, 10 representa interferiu completamente.
8. Habilidade de caminhar
Um representa, não interferiu, 10 representa interferiu completamente.
9. Habilidade de correr
Um representa, não interferiu, 10 representa interferiu completamente.
10. Habilidade de subir escadas, calçadas, degrau da parta, etc
Um representa, não interferiu, 10 representa interferiu completamente.
IMPRESSÃO GERAL
11. Atividade geral
Sofrível, Normal, Bom, Muito bom ou Excelente
ABORDAGEM RECOMENDADA PELA American Animal Hospital Association (AAHA)
AVALIAÇÃO
Prioriza a avaliação completa da dor usando uma combinação de indicadores comportamentais, fisiológicos e contextuais. Além disso, recomenda avaliações regulares da dor para ajustar os planos de tratamento com base na evolução das necessidades do paciente.
ABORDAGEM MULTIMODAL
Enfatiza uma abordagem multimodal para o tratamento da dor, combinando intervenções farmacológicas e não farmacológicas. Incentiva planos de tratamento personalizados, considerando o tipo e a gravidade da dor.
INTERVENÇÕES FARMACOLÓGICAS
Fornece diretrizes para o uso apropriado de medicamentos analgésicos, incluindo opioides, anti-inflamatórios não esteroides e outros medicamentos. Enfatiza a dosagem individualizada, o monitoramento dos efeitos colaterais e a consideração da saúde geral do paciente.
MONITORAMENTO DO PACIENTE
Defende o monitoramento regular do paciente para avaliar a eficácia das intervenções de controle da dor. Recomenda adaptar os planos de tratamento com base na resposta do paciente e em quaisquer preocupações emergentes.
EDUCAÇÃO DO CLIENTE
Promove a educação do cliente sobre o reconhecimento de sinais de dor em seus animais de estimação e a compreensão da importância do controle da dor. Incentiva a comunicação aberta com os donos de animais de estimação sobre opções de tratamento, possíveis efeitos colaterais e expectativas realistas
TREINAMENTO DA EQUIPE
Enfatiza a necessidade de treinamento contínuo da equipe para se manter atualizado sobre a evolução das técnicas e melhores práticas de controle da dor. Incentiva uma abordagem colaborativa dentro da equipe veterinária para otimizar o tratamento da dor para os pacientes.
PROCESSO BÁSICO DE AVALIAÇÃO DA DOR DA AAHA
Para avaliação da dor aguda e crônica, os elementos centrais, seja para dor aguda ou crônica, são o exame físico e palpação e a utilização de medidas de metrologia da dor, entre as diversas disponíveis.
Tais medidas, padronizadas, são obtidas mediante procedimentos padronizados, gerais, em cada alternativa. Medidas padronizadas para circunstâncias específicas (por exemplo, para tipos específicos de cirurgia ou para doenças crônicas específicas) estão sendo desenvolvidas, testados e validadas.
Atualmente, para a dor crônica, todos as medidas para avaliar o impacto da dor foram desenvolvidos para a osteoartrite, embora estes tenham sido aplicados a outras condições de “dor nos membros”, como o osteossarcoma.
O processo preconizado ressalta dois elementos importantes, o envolvimento do proprietário e o acompanhamento e reavaliação
EM SÍNTESE
Gostamos de ver que o tratamento da dor encontrou diretrizes objetivas para recomendar aos profissionais, pelo menos nos USA.
Claro está que não cabe a nós, leigos, ingressar em domínios privativos do Médico Veterinário, tais como os métodos de verificação, anamnese, o arsenal farmacológico, por exemplo.
Mas, podemos nos beneficiar dessas diretrizes, principalmente no que respeita às recomendações de analgesia, à participação do cliente, às recomendações de manejo no ambiente domiciliar.
O cliente desempenha um papel importante no manejo da dor, fornecendo o histórico relevante do paciente, participando da avaliação e reavaliação do paciente e aderindo às recomendações de tratamento, incluindo a administração do tratamento. Para tanto, caberá ao Médico Veterinário instruir o cliente sobre a ministração do tratamento. Igualmente, caberá ao cliente realizar um reporte fidedigno dos sintomas do paciente, documentando-o com registros por escrito (pode se inspirar no BREVE INVENTÁRIO DE DOR CANINA apresentado neste Post), bem como fotos e vídeos que demonstrem os comportamentos anômalos.
As práticas que implementam uma abordagem integrada ao tratamento da dor garantem que todos os membros da equipa de saúde e os seus clientes compreendem os seus respetivos papéis na prevenção e controle da dor nos seus pacientes e animais de estimação. Esta responsabilidade partilhada garante que a gestão eficaz da dor será uma característica central do cuidado compassivo para cada paciente